quinta-feira, 3 de julho de 2008

EXIGÊNCIA DE LICENCIAMENTO DE ATIVIDADE DE IMPACTO LOCAL


Atividades consideradas de impacto local, destarte isentas de licenciamento ambiental estadual, localizadas em municípios não habilitados à licenciar pelo órgão ambiental estadual, podem ficar, legalmente, sem licenciamento?


Para um melhor entendimento convém dividir e adaptar a questão. Primeiro: independentemente do órgão habilitado a licenciar, ou melhor, do órgão competente para processar e conceder a licença ambiental, uma atividade potencialmente poluidora poderia ficar sem licenciamento? Segundo: quem é competente para licenciar atividades de impacto local?

Passamos a responder. Nenhuma atividade potencialmente poluidora pode ser exercida em território nacional sem licença ou autorização do órgão ambiental competente. Contrariar esta disposição configura crime punido com detenção de 1 a 6 meses ou multa, ou ambas cumulativamente, conforme artigo 60 da Lei 9.605/1998.

Quanto à competência temos três diplomas a analisar: Constituição Federal, Lei 6.938/1981 e resolução CONAMA 237/1997.

A Constituição Federal estabelece em seu artigo 23, VI, ser competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas.

São comuns as competências administrativas. O licenciamento ambiental é atividade administrativa, logo é competência comum de todos os entes federativos, incluído o município, para os casos de interesse local.

O artigo 10 da Lei 6.938/1998 dispõe que as atividades efetiva ou potencialmente poluidoras dependerão de prévio licenciamento ambiental do órgão estadual competente e, supletivamente, do Instituto Brasileiro dos Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis, IBAMA. Disso se depreende que em regra os licenciamentos são procedidos pelos órgão ambientais estaduais.

Ocorre que a citada Lei foi editada antes da Constituição Federal atual, de modo que, embora não faça menção do município, este permanece competente para o licenciamento, uma vez que recebeu tal competência da Constituição, norma suprema em nosso ordenamento jurídico.

Portanto, todos os Municípios brasileiros são constitucionalmente competentes para licenciar atividades de impacto local.

Mas temos a Resolução CONAMA 237/1997 que dispõe, em seu artigo 6°, ser competência do órgão ambiental municipal o licenciamento de atividades de impacto local e daquelas que lhe forem delegadas pelo Estado por instrumento legal ou convênio.

Em acordo a essa resolução, o município licenciará as atividades de impacto local e outras de impacto não exclusivamente local que o Estado lhe delegar. Assim, novamente o Município não precisa ser “habilitado” pelo Estado para licenciar atividades de impacto local, tais serão licenciadas pelo Município independentemente de delegação do Estado.

Agora, nos casos em que o Município não tenha estrutura administrativa, legal ou operacional adequadas para proceder aos licenciamentos, os Estados têm competência para, em caráter suplementar, licenciar as atividades de impacto local.

Importante lembrar que existem questionamentos quanto à constitucionalidade da instituição de licenciamento único por uma resolução do CONAMA. A Constituição Federal estabeleceu em seu artigo 23, parágrafo único, que as normas de cooperação para exercício da competência comum serão disciplinadas por Lei Complementar, a propósito ainda não editada. Dessa forma, salvo melhor entendimento, embora seja uma solução adequada o procedimento instituído pela resolução, ela não seria válida frente à Constituição Federal.

Contudo, a jurisprudência ainda escassa parece tender ao acolhimento da validade e constitucionalidade da Resolução 237 CONAMA, como se pode ver na decisão abaixo:


ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRAS DE DRAGAGEM E BOTA-FORA DA FOZ DO RIO CAMBORIÚ. LICENCIAMENTO E FISCALIZAÇÃO.

O fato de o bem afetado pertencer à União não implica a necessidade de licenciamento ou fiscalização ser realizado pelo órgão federal competente. O que interessa, segundo a lei, é a magnitude do dano (§ 4º, do artigo 10, da Lei nº 6.938/81).

O licenciamento deferido pela FATMA, órgão estadual de controle ambiental, não exclui a possibilidade de que o IBAMA, no exercício da competência prevista no artigo 23, VI, da CF/88, impeça a realização da obra, uma vez constatada a degradação ao meio ambiente.

Não se vislumbra inconstitucionalidade impingida na Resolução 237 do CONAMA, tendo-se em vista que foi expedida em harmonia com a Constituição da República e com a legislação federal, sendo, portanto, meio legislativo idôneo para esmiuçar e regulamentar o comando legal que, por sua natureza geral, não se ocupa de questões específicas e particulares.(TRF4; Ap ACP Nº 2002.72.08.003119-8/SC. Relator VALDEMAR CAPELETTI. Publicado no D.J.U de 28/09/2005.)


A título de curiosidade, desse acórdão foram interpostos Recurso Extraordinário e Recurso Especial, mas ainda esperam julgamento.

Concluindo, nenhuma atividade efetiva ou potencialmente poluidora pode ficar legalmente sem licenciamento. Ainda que seja competência do Município e este não tenha condições legais, administrativas ou operacionais para o procedimento, a atividade deverá então ser licenciada, em caráter supletivo pelo órgão ambiental estadual.